Here you will find the Long Poem O Soldado Espanhol of poet Antonio Goncalves Dias
I O céu era azul, tão meigo e tão brando, E a terra era a noiva que bem se arreava Que a mente exultava, mais longe escutando O mar a quebrar-se na praia arenosa. O céu era azul, e na cor semelhava Vestido sem nódoa de pura donzela; E a terra era a noiva que bem se arreava De flores, matizes; mas vária, mas bela. Ela era brilhante, Qual raio do sol; E ele arrogante, De sangue espanhol. E o espanhol muito amava A virgem mimosa e bela; Ela amante, ele zeloso Dos amores da donzela; Ele tão nobre e folgando De chamar-se escravo dela! E ele disse: ? Vês o céu? ? E ela disse: ? Vejo, sim; Mais polido que o polido Do meu véu azul cetim. ? Torna-lhe ele... (oh! quanto é doce Passar-se uma noite assim!) ? Por entre os vidros pintados D?igreja antiga, a luzir Não vês luz? ? Vejo. ? E não sentes De a veres, meigo sentir? ? É doce ver entre as sombras A luz do templo a luzir! ? E o mar, além, preguiçoso Não vês tu em calmaria? ? É belo o mar; porém sinto, Só de o ver, melancolia. ? Que mais o teu rosto enfeita Que um sorriso de alegria. ? E eu também acho em ser triste Do que alegre, mais prazer; Sou triste, quando em ti penso, Que só me falta morrer; Mesmo a tua voz saudosa Vem minha alma entristecer. ? E eu sou feliz, como agora, Quando me falas assim; Sou feliz quando se riem Os lábios teus de carmim; Quando dizes que me adoras, Eu sinto o céu dentro em mim. ? És tu só meu Deus, meu tudo. És tu só meu puro amar, És tu só que o pranto podes Dos meus olhos enxugar. ? Com ela repete o amante: ? És tu só meu puro amar! ? E o céu era azul, tão meigo e tão brando E a terra tão erma, tão só, tão saudosa Que a mente exultava, mais longe escutando O mar a quebrar-se na praia arenosa! II E o espanhol viril, nobre e formoso, No bandolim Seus amores dizia mavioso, Cantando assim: ?Já me vou por mar em fora Daqui longe a mover guerra, Já me vou, deixando tudo, Meus amores, minha terra. ?Já me vou lidar em guerras, Vou-me à índia Ocidental; Hei de ter novos amores... De guerras... não temas ai. ?Não chores, não, tão coitada, Não chores por t?eu deixar; Não chores que assim me custa O pranto meu sofrear. ?Não chores! - sou como o Cid Partindo para a campanha; Não ceifarei tantos louros, Mas terei pena tamanha.? E a amante que assim o via Partir-se tão desditoso, ? Vai, mas volta; lhe dizia: Volta, sim, vitorioso. ?Como o Cid, oh! crua sorte! Não me vou nesta campanha Guerrear contra o crescente, Porém sim contra os d?Espanha! ?Não me aterram; porém sinto Cerrar-se o meu coração, Sinto deixar-te, meu anjo, Meu prazer, minha afeição. ?Como é doce o romper d?alva, É-me doce o teu sorrir, Doce e puro, qual d?estrela De noite ? o meigo luzir. ?Eram meus teus pensamentos, Teu prazer minha alegria, Doirada fonte d'encantos, Fonte da minha poesia. ?Vou-me longe, e o peito levo Rasgado de acerba dor, Mas comigo vão teus votos, Teus encantos, teu amor! ?Já me vou lidar em guerras, Vou-me à índia Ocidental; Hei de ter novos amores... De guerras... não temas ai.? Esta era a canção que acompanhava No bandolim, Tão triste, que triste não chorava Dizendo assim. III ?Quero, pajens, selado o ginete, Quero em punho nebris e falcão, Qu?é promessa de grande caçada Fresca aurora d?amigo verão. ?Quero tudo luzindo, brilhante ? Curta espada e venáb?lo e punhal, Cães e galgos farejem diante Leve odor de sanhudo animal. ?E ai do gamo que eu vir na coutada, Corça, onagro, que eu primo avistar! Que o venáb?lo nos ares voando Lhe há de o salto no meio quebrar. ?Eia, avante! ? dizia folgando O fidalgo mancebo, loução: ? Eía, avante! ? e já todos galopam Trás do moço, soberbo infanção. E partem, qual do arco arranca e voa Nos amplos ares, mais veloz que a vista, A plúmea seta da entesada corda. Longe o eco reboa; ? já mais fraco, Mais fraco ainda, pelos ares voa. Dos cães dúbios o latir se escuta apenas, Dos ginetes tropel, rinchar distante Que em lufadas o vento traz por vezes. Já som nenhum se escuta... Quê! ? latido De cães, incerto, ao longe? Não, foi vento Na torre castelã batendo acaso, Nas seteiras acaso sibilando Do castelo feudal, deserto agora. IV Já o sol se escondeu; cobre a terra Belo manto de frouxo luar; E o ginete, que esporas atracam, Nitre e corre sem nunca parar. Da coutada nas ínvias ramagens Vai sozinho o mancebo infanção; <